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Archive for the ‘Nevermind – Nirvana’ Category

texto de Tiago Trigo (@ttrigo)

Eu cresci ouvindo rock. Sim, cresci mesmo. Com três, quatro anos, já estava sentado no quarto ouvindo AC/DC e Led Zeppelin.  Quando falo isso as pessoas acham que quero bancar o precoce. Não é. Quem me conhece sabe que hoje não sou um voraz consumidor de música e suas novidades. Estou meio brigado com a música já faz um tempo.  É, eu tenho dessas.

E eu já briguei com o rock. Foi em 91/92, quando as rádios e a MTV (o que um adolescente de 12 ou 13 anos tinha à época para conhecer bandas, além da revista Bizz) nos enchiam com pop como Madonna e Michael Jackson e não conseguia conhecer nada novo que me agradasse.

Passei os anos 80 ouvindo discos de AC/DC, Van Halen, Kiss, Queen, Rolling Stones, Beatles, Led Zeppelin, Black Sabbath, Rush, The Clash… Uma verdadeira salada. Era totalmente influenciado por um primo mais velho, com quem passava as tardes ouvindo LPs (aquilo que agora chamam de vinil e custa caro porque virou vintage).  Gostava bastante, mas eram todas bandas antigas e eu queria algo novo. Em 1990, a MTV chegou ao Brasil, mas a programação não empolgava. As sensações do rock mainstream no momento eram Bon Jovi e Guns n’Roses, o que eu abominava, como você pode concluir.

Nem sei bem como, mas minha briga com o rock me levou para o rap. A antiga Metropolitana FM de São Paulo tinha um programa chamado “Projeto Rap Brasil”, que tocava Thaíde & DJ Hum, Ndee Naldinho, Pepeu, um monte de outras coisas que eu não lembro e, claro, o maior de todos do gênero até hoje no país: Racionais MCs, que a esta altura estava lançando o segundo disco, já chamando a atenção de branquelos não nascidos na periferia, como eu.

Foi então que na MTV – eu não lembro bem se na primeira vez foi no Lado B ou durante a programação (perdoe-me, faz quase 20 anos) – eu vi três cabeludos  fazendo um puta barulho. Riffs de guitarra simples e matadores, melodias que grudavam na minha cabeça e berros que faziam aquela fúria adolescente extrapolar os limites da minha barba rala. Eu sei que é clichê puro, mas por mais que gostasse de rap (hoje eu fiquei mais no Racionais, o restante já deixei de lado), me encontrei com Nirvana. Aquele blábláblá todo de “hino de uma geração” soava como a mais absoluta verdade para mim.

A primeira coisa a fazer foi colocar fitas cassete no aparelho de som e esperar por alguma música do Nirvana na rádio; os botões de rec e pause sofreram bastante com os dedos ansiosos deste ex-moleque. Foi tudo muito rápido. De repente já tinha comercial da gravadora no intervalo do Globo Esporte para vender o Nevermind.

Corri comprar o disco na Mesbla. Era uma loja de departamentos que acabou há muito tempo. Você que nasceu no final dos anos 80 já não conhece.  Não, eu ainda não ia à Galeria do Rock (o que passei a fazer em 93), mas sei que CD não custava caro naquela época.  Escutei “Smells Like Teen Spirit” um milhão de vezes, mas não fiquei só nela: o disco era 90% feito de hits. E as letras? O encarte não as tinha e o Google nem sonhava existir. Algumas revistas de banca salvaram, o ouvido pouco treinado em inglês ajudou, mas confesso que devo ter estuprado umas estrofes do Kurt Cobain muitas vezes.  Minha vida tinha mudado. Agora eu tinha que montar uma banda.

Depois, pelas revistas, descobri o Bleach. E o meu cabelo, que tinha acabado de ser devastado por uma “máquina um”, tinha que crescer. Tempos difíceis. Aí o Nirvana veio para o Brasil, e eu não tinha idade para ir ao show, nem malícia para falsificar identidade. Será que ia colar? Eu ia ser pego? Alguém vai dizer que um fã de verdade faz qualquer coisa, mas, porra, eu era só um moleque de 13 anos. Tive que me contentar em gravar a tosca transmissão da TV Globo (com direito a Maria Paula estragando a introdução de “Smells Like” e o Maurício Kubrusly falando um monte de bobagens, como sempre) do show da banda no Hollywood Rock no Rio. Tenho este VHS (coisa que você que não conhece a Mesbla também não sabe o que é) até hoje. Depois eu soube que o show deles em São Paulo foi “o pior da carreira”. Com certeza eu não teria percebido (ou me importado).

E comprei o Incesticide. Melhor fase da MTV para mim (sim, Pearl Jam, Alice in Chains, Sepultura, Metallica e até Pantera…). Gravava tudo que tivesse o Nirvana envolvido. Um monte de VHS com gravações ruins, porque tinha que virar a anteninha do UHF o tempo todo e a imagem nunca ficava perfeita.

Então veio o In Utero, barulhento, mesmo com a tal mixagem nova, que “limpou” o som do Steve Albini. Comprei no lançamento e devo ter ficado uma semana sem sair de casa, só ouvindo. E veio o Acústico MTV. (Sim, eu assisti e gravei, cortando os intervalos da MTV, no mesmo esquema do rec e pause do cassete).

Já estava prestes a fazer 15 anos, quando, em abril de 94, peguei o Jornal da Tarde em uma manhã e vi a chamada “Morto Kurt Cobain, do Nirvana”. Eu não acreditava. Corri ler a matéria. Senti-me traído pelo meu melhor amigo. Como ele pôde fazer isso comigo? Um dos sintomas do problema que é ter 14, 15 anos: você se dá muito melhor com astros de rock do que com seus amigos do colégio ou da rua.

Busquei refúgio no punk rock e consegui, finalmente, montar a primeira banda, a segunda… As músicas do Nirvana ainda estão aí, embora eu sempre vá pensar que poderia ter havido mais alguns discos. O Nevermind com o selo da Mesbla eu perdi em 2005, quando roubaram meu carro. Ia comprar outro, mas desisti. Ter as músicas só pra ouvir de vez em quando é fácil na era do mp3. Ter um outro disco comprado em 2005 ia estragar toda a história.

Ao longo dos anos 2000, briguei com o rock e a música de novo. Este monte de bandas de plástico que estão mais preocupadas com as pistas de danças do que com as guitarras não me toca. Se bem que se aparecesse um outro Nirvana, as coisas poderiam mud… mas eu também não tenho mais 13 anos. Bem, tanto faz , deixa pra lá.

Tiago Trigo é jornalista, curintia, companheiro de viagem por Argentina e Chile e uma das pessoas mais engraçadas que conheço. Apresenta o programa Scream & Yell On The Radio na Rádio Levis


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